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Se apega, sim!

  • Foto do escritor: Fê Pier
    Fê Pier
  • 3 de dez. de 2020
  • 4 min de leitura

Atualizado: 1 de abr. de 2021

Eu sempre tive a sensação de que nasci na época errada. Eu, como toda taurina com o agravante do ascendente também em touro, sou uma pessoa extremamente nostálgica. Sou nostálgica até com o que eu sequer vivi. Vivo sonhando pelos cantos com uma época em que eu nem existia mas que tudo pra mim parece que fazia muito mais sentido.


Quando eu era criança achava que era por causa do falecido cavalheirismo dos homens e que isso que era bonito. Depois que me descobri feminista percebo que não era exatamente isso que eu gostava, mas me encantava o cuidado que as pessoas tinham umas com as outras.


Cuidado esse que era demonstrado por atitudes ou palavras, mas me parece que era muito claro que as duas partes envolvidas eram dois seres humanos que mereciam um mínimo de atenção e carinho.


Antigamente, as coisas eram mais simples - diz a pequena anciã que reside dentro do meu (não tão) jovem corpo de 28. Particularmente, tenho uma teoria de que é a revolução da informação que está acabando com a humanidade. Não no sentido dos filmes de Hollywood em que o mundo efetivamente acaba, mas está acabando com o “humano” dos seres (ETIM lat. “humãnus” - próprio do homem, bondoso, erudito, instruído nas humanidades).


De fato, não sou chegada nas tecnologias. Esse mundo de hoje de milhões de informações, estímulos, notícias e gigabytes por segundo me assusta. Em um segundo mal dá pra inspirar e expirar suficientemente bem pro oxigênio chegar a todas as células do seu corpo. Mas antes que ele chegue você já leu 3 notícias falsas, curtiu 8 fotos no insta, comentou uma foto no Facebook e os mais ousados fizeram até um Tweet desabafo sobre as futilidades do mundo moderno. É, não é fácil viver nesse mundo.


Tudo aparece e desaparece diante de nós como num passe de mágica. É como uma mão aberta embaixo de uma torneira que sente a água transpassar pelos seus dedos mas não consegue segurá-la. Tudo simplesmente transpassa por nossos dedos, por nossos olhos, pela nossa existência. E no minuto seguinte já esquecemos e seguimos em frente, secos (em todos os sentidos), como se nada tivesse acontecido. Vivemos tempos líquidos mesmo, sábio Bauman.


Ninguém se apega a nada. Ninguém quer se apegar a nada e nem a ninguém. Deus me livre de deixar transparecer um interesse, vai que elx foge com medo do casório que elx nem imaginou. Tem até livro ensinando a não se apegar a ninguém pra entrar pro clube moderninho dos socialmente pseudo livres.


Eu não sei dizer se foi a tecnologia que criou e incentivou essa falta de apego das pessoas, ou se foi a falta de apego que estimulou a tecnologia a encontrar cada vez mais meios de fuga para as pessoas não terem mais que lidar com nada. Também não importa qual foi o ovo e qual foi a galinha. O que importa é que (pra mim, infelizmente) é o mundo em que vivemos.


Ao mesmo tempo que ninguém se apega a nada, ninguém também sabe mais ficar sozinho. O smartphone virou seu melhor amigo, seu namorado, seu barzinho, seu cardápio (de comidas e pessoas), seu confessionário, seu psicólogo, sua passeata, sua ostentação, sua família, sua vitrine, seu outlet, sua empresa, sua imprensa, sua vida toda tá ali! E eu, taurina, nostálgica, apegada e (com uma pitada de peixes) sonhadora, não gosto nada disso.

Não quero e não vou reduzir minhas relações sociais às redes sociais, não troco uma boa conversa olho no olho por um debate nos comentários, não interpreto likes como elogios sinceros. Pra mim, não são!


Eu também não quero ter que deixar de demonstrar interesse pros outros porque o que o cool é ser desapegado. Eu não quero deixar de expressar o que eu admiro em alguém pra não interpretarem isso como se eu tivesse completamente apaixonada. E se eu tiver também, o que é que tem?


Eu não quero deixar de acreditar que quando uma pessoa diz que quer te ver ela realmente quer te ver e vai fazer isso acontecer. Eu não quero ter que duvidar quando alguém me chama pra sair porque pode ser que o dia chegue e ela não fale nada e eu fique frustrada. Antigamente, acho eu, as palavras tinham força, os compromissos tinham validade e as pessoas tinham valor.


Afinal aquilo que você trata como se fosse um nada totalmente insignificante pro qual você não se dá nem o trabalho de responder, é um SER HUMANO. Tem dois olhos pra ver que você tá online e propositalmente ignorando-o, tem dois ouvidos pra escutar o que você diz com todo cuidado do mundo, tem duas mãos pra te dar aquele abraço apertado e sincero de quem queria te ver de verdade, tem um cérebro pra refletir sobre a vida e questionar com você a razão de tudo e, principalmente, tem um coração pra transformar em ternura todo o amargor desse mundo.


E veja só você, pode acontecer desse coração te curtir, assim, de graça. Pode acontecer desse coração perceber os detalhes da sua existência que às vezes passam desapercebidos até por você mesmo. Pode acontecer desse coração te dar a chance de sair desse mundo virtual do desapego, dos cardápios de dates, das relações relâmpago, e ter uma relação de verdade com alguém.


Meu bem, se surgir essa chance pra você de conhecer o que é cuidado, o que é carinho, o que é atenção, por favor, não desperdice só pra parecer desinteressado.


O mundo precisa, sim, de mais amor! Sempre!


Mas ele precisa, principalmente, de mais gente com disposição pra amar!

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