O primeiro beijo (gelado) a gente nunca esquece
- Fê Pier
- 1 de abr. de 2021
- 3 min de leitura
Estamos vivendo em uma era de estímulos incessantes que chegam até nós sem que procuremos e nos fazem ficar ligados 24h por dia, 7 dias por semana, dia e noite sem parar. A quantidade de informações que a gente recebe hoje é infinitamente maior do que a que o nosso cérebro consegue processar, por isso não conseguimos mais nos desligar facilmente, ficar em paz, dormir bem. Dormimos cada vez mais tarde, e cada vez pior.
Pra driblar as tecnologias eu procurei uma forma de encontrar essa paz e encontrei a meditação. A técnica de meditação que eu pratico consiste em me desligar de tudo, deixar a mente um completo vazio, cheio de nada (sim, eu gosto de figuras de linguagem), por alguns minutos do dia. O objetivo é fazer você observar seus pensamentos sem se aprofundar neles e, assim, entrar em contato com você mesmo, se encontrar no meio desse caos de informação.
Dentre os muitos benefícios de praticar a meditação, um dos mais importantes é tornar-se mais sereno e mais auto consciente do presente. Você passa a se preocupar com o que está fazendo naquele momento, sua atenção e concentração se voltam somente para aquilo, e assim sua mente não fica viajando na maionese por aí. Mas é um exercício diário, e não é fácil começar.
Por isso eu já fui logo imaginando outras formas através das quais nós meditamos no decorrer do nosso dia, sem sequer sabermos disso. Nós meditamos toda vez que paramos tudo que estamos fazendo e pensando e então nos concentramos em apenas uma coisa, um momento, uma sensação. É aqui que eu queria chegar.
Você pode não perceber, mas está praticando a meditação toda vez que lê um livro, escreve um texto (não mensagem de whatsapp né, people!). Tem gente que medita quando vai à praia e contempla a vista (o mar tem um poder sobrenatural de absorver e dissolver todos os nossos pensamentos/problemas), tem gente que medita quando aprecia um bom vinho, tentando identificar todas as matérias primas que foram usadas na sua fabricação, e muitas outras coisas podem ser meditação.
Mas a minha meditação preferida é a sensação do primeiro gole de um chopp gelado, numa sexta-feira pós expediente, depois de uma semana de muito trabalho e estresse. Ahhh, só de pensar dá água na boca. Não se engane achando que se beber todo dia após o trabalho a sensação será a mesma, todos os requisitos acima tem que, necessariamente, estar presentes para que o ritual se torne uma meditação.
Nessas condições, e somente nessas, não existe um ser humano na terra que não se concentre nesse momento sublime. É como um primeiro beijo, mas pode acontecer várias vezes durante a nossa vida. Independente de quem está presente, se houve brinde antes, se já afrouxou ou não a gravata... Aqueles milésimos de segundo que antecedem e sucedem o beijo gelado são incomparáveis.
A sede, o cansaço do trabalho, o estresse da semana, a vontade de relaxar, a ansiedade pelo descanso, todos esses sentimentos juntos vêm à tona enquanto você calmamente leva sua mão em direção a aquele copo cheio, gelado e suado.
E a viagem começa por ali, como se nas pontas dos seus dedos tivessem papilas gustativas que, ao invés do gosto, são acionadas pelo toque. A sensação de frescor começa a invadir seu corpo e vai relaxando um a um os seus neurônios, desligando a CPU e colocando tudo no modo avião para não ser perturbado.
A visão também colabora. A cor amarela remete à alegria, positividade, nada de ruim pode acontecer. O colarinho branco milimetricamente calculado com espessura de dois dedos assentado acima do líquido dourado estoura bolhas que lentamente sobem à superfície e te convidam a fazer uma festa dentro da sua boca.
A sua boca saliva, seu peito palpita, até que o encontro acontece. Seus lábios tocam aquela superfície fria de vidro que parece preparar todo o seu corpo para o que está por vir, aquele fluido gelado, levemente amargo porém incrivelmente refrescante toma conta de você, e não dá pra pensar em outra coisa nessa hora. Beer porn explícito atingindo o seu ápice de esplendorosidade! Poucas coisas na vida são tão mágicas como esse momento.
E se um dia você conseguiu, por um equívoco irreparável e imperdoável, não prestar total atenção nesse momento de meditação, não deixe que este erro se repita jamais. Agora, me dá licença que eu vou ali meditar!
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